segunda-feira, 25 de maio de 2015

A casa que não morava ninguem


“Seu desejo foi tão grande que acabou soterrando-a e a expulsou de seu próprio mundo. De um mundo que não poderia ter habitantes, de um mundo perfeito”

          Um dia existiu alguém que possuiu um desejo, o desejo de ter uma casa. Era um desejo pequeno, tão pequeno quanto um caroço de feijão, e ele foi alimentado pelas ilusões de felicidade e também pelas desilusões de sua ausência, encontradas naquele caminho que ao mesmo tempo que foi escolhido, não foi escolhido, mas foi perseguido as escuras.

          Um dia as desilusões invadiram aquele alguém e o pé de feijão cresceu mais um pouco, alimentado pela tristeza. E por um momento, ele serviu como ajuda, trazia um pouco de alívio à alma, enquanto sugava um pouco da dor e crescia mais um pouco.

          Pouco a pouco, sem que aquela pessoa percebesse, seu desejo estava ficando cada vez maior, e a necessidade de realizá-lo para poder fugir das desilusões se tornou um vício.

          Quando seu desejo foi realizado, ele já estava maior que antes, então não foi o suficiente, e a busca pelo aperfeiçoamento do sonho se iniciou. Nessa casa também existiam outros desejos, e eles moravam juntos, pois havia muito espaço para todos. Mas um dia esse espaço começou a diminuir.

          O desejo dela se tornou grande de mais, tão grande que suprimiu todos os outros desejos que ali viviam, eles não puderam mais existir onde não havia espaço para viver.

          No dia que a casa se tornou perfeita, qualquer desejo a mais, a tornaria imperfeita, então para o grande sonho ser realizado, os outros desejos desapareceram. E quando a casa se tornou perfeita, a mente finalmente se tornou limpa e sozinha.

          Mas os humanos nunca se completam totalmente, por esse motivo, a lacuna de sua incompletude deu lugar para a solidão, então surgiu o arrependimento, a tristeza, a culpa, o medo e a saudade, e uma mente imperfeita não poderia existir em uma casa perfeita, então, para continuar nela, aquela pessoa tentou fazer como da primeira vez, tentou deixar a casa ainda mais perfeita, para que ficasse em paz.

          E durante alguns anos ela aperfeiçoou incansavelmente sua casa, dia após dia, até o tempo em que não havia mais nada para mudar, e então a solidão voltou.

          Nessa hora ela finalmente olhou para dentro de si e finalmente entendeu que não podia ser perfeita como sua casa, ela entendeu que era imperfeita, e também percebeu que não podia mais morar nela. Seu desejo foi tão grande que acabou soterrando-a e a expulsou de seu próprio mundo. De um mundo que não poderia ter habitantes, de um mundo perfeito.

          Finalmente, fora de seu vício, ela viu que tinha perdido muito tempo tentando curar suas dores do coração, com algo que estava fora do corpo e que por isso, não podia entrar em sua casa. E só quando suas dores se tornaram menores, depois de encarar o espelho de frente, ela pôde voltar para sua casa, que agora era imperfeita, mas com espaço suficiente para os outros desejos morarem novamente e expulsarem a tristeza, a culpa, o medo e a saudade e trazer de volta a alegria que a muito tempo havia deixado aquele lugar.



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